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Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil

5 de outubro de 2004

OS SINTOMAS DA PAIXÃO

O título é meio brega. Ia ser pior ainda. A primeira idéia era “Os sintomas do amor”, mas aí eu caí na real e vi que até hoje, aos 28 anos de idade, eu ainda não conheci o amor. Não faço idéia do que sente uma pessoa que ama, porque na minha história pessoal nenhum relacionamento ultrapassou os dois anos de vida e eu imagino que o amor seja uma coisa que nasce depois, com o tempo, como aquele casal sessentão que vi andando de mãos dadas hoje na praça.
Posso não entender de amor, mas de paixão acho que entendo. Entendo sim porque já me apaixonei e já até tentei me desapaixonar, e não consegui. É como saber que estou doente de uma doença para a qual a medicina ainda não descobriu a cura. Você fica meio desesperado porque aquilo não passa, ou demora a passar, e não há remédio que cure ou pelo menos alivie a dor.
Falei em doença e explico o porquê: na minha opinião, a paixão é algo que pode ser diagnosticado tal qual uma gripe, através de uma análise específica dos sintomas. E a minha intenção aqui é tentar enumerar alguns destes sintomas para que qualquer um possa fazer um auto-exame e descobrir se tem ou não a tal “enfermidade”. É bem provável que o meu intuito seja vão, uma vez que me baseio única e exclusivamente numa cobaia solitária, eu mesmo, enquanto o método científico clama por amostragens maiores a fim de se aproximar ao máximo de resultados verídicos.
Como não sou cientista, tomo a liberdade de quem não pretende ser levado a sério para enumerar, de 1 a 10, os sintomas da paixão. É muito fácil. Você pode ter certeza que está apaixonado se:

1. Você se flagra pensando nela às três da tarde de uma terça-feira repleta de trabalho e tem uma vontade incontrolável de parar tudo que está fazendo só pra telefonar e ouvir aquele jeito de falar que só ela tem e você não entende como é que pode...;

2. O simples fato de saber que na sexta-feira vai ter uma festa e ela vai estar lá já te faz lembrar que suas calças estão muito velhas e que você precisa urgente ir ao shopping pra comprar uma calça nova;

3. Toda vez que você sabe que vai se encontrar com ela você toma aquele banho com atenção redobrada, gasta quase o sabonete inteiro, usa e abusa do xampu e quando sai do banho faz a barba mais meticulosa da década e passa o perfume em todas as vinte e três partes do corpo que, nas suas fantasias antecipadas, ela cheirou;

4. Ela chega na festa que você já sabia há muito tempo que ela ia, tanto que passou a semana inteira ensaiando sozinho conversas interessantes, mas mesmo assim bate uma súbita taquicardia e um nervosismo tão besta que ela te fala “oi” e você não consegue responder direito;

5. Na hora que você vai deixá-la em casa, depois da festa, você pára o carro na porta, mas fica rezando por dentro pra não chegar nunca o momento da despedida, fica ali com ela demorando até o dia nascer e quando ela fala que tem que ir você pergunta: -Mas já?;

6. Ao acordar de manhã, no exato instante em que o cérebro começa a funcionar, a primeira coisa que você se lembra é que vocês ficaram juntos na véspera e isso te dá vontade de dar um pulo da cama como quem comemora um gol, mas você não pula e fica deitado mesmo, se enrola no cobertor e ri sozinho;

7. Você fica se policiando o dia inteiro pra não ligar pra ela no dia seguinte, porque você tem medo de ligar e ela te achar muito pegajoso e se desinteressar, mas mesmo assim chega uma hora que você não consegue e acaba ligando;

8. Deitado na cama, à noite, você se lembra de um livro que ela falou que estava louca pra ler e fica doido pra chegar logo o dia seguinte que é pra você poder comprar o tal livro e deixar na portaria do prédio em que ela mora, com um cartão com seu nome e umas palavras que só você mesmo poderia ter escrito;

9. Toca uma música no rádio e você logo pensa que essa música é a cara dela, mas aí essa música acaba e começa uma outra música que é tão a cara dela quanto a que acabou de tocar;

10. Naquele boteco, só você e ela, conversando e comendo aquele tira-gosto manjado com uma cerveja gelada quase banal, você subitamente constata que não existe nenhum outro lugar do mundo em que você preferiria estar naquele momento que não fosse ali mesmo, naquele boteco ordinário, com ela.


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